O site da revista Nova escola preparou um guia especial com informações e orientações para evitarmos equívocos em relação a cultura indígena
O que (não) fazer no Dia do Índio
http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/nao-fazer-dia-indio-cultura-indigena-624334.shtml
Na data em homenagem aos primeiros habitantes do Brasil, uma série de estereótipos e preconceitos costuma invadir a sala de aula. Saiba como evitá-los e confira algumas propostas de especialistas de quais conteúdos trabalhar
O Dia do Índio é comemorado em 19 de abril no Brasil para lembrar a data histórica de 1940, quando se deu o Primeiro Congresso Indigenista Interamericano. O evento quase fracassou nos dias de abertura, mas teve sucesso no dia 19, assim que as lideranças indígenas deixaram a desconfiança e o medo de lado e apareceram para discutir seus direitos, em um encontro marcante.Por ocasião da data, é comum encontrar nas escolas comemorações com fantasias, crianças pintadas, música e atividades culturais. No entanto, especialistas questionam a maneira como algumas dessas práticas são conduzidas e afirmam que, além de reproduzir antigos preconceitos e estereótipos, não geram aprendizagem alguma. "O índigena trabalhado em sala de aula hoje é, muitas vezes, aquele indígena de 1500 e parece que ele só se mantém índio se permanecer daquele modo. É preciso mostrar que o índio é contemporâneo e tem os mesmos direitos que muitos de nós, 'brancos'", diz a coordenadora de Educação Indígena no Acre, Maria do Socorro de Oliveira.
Saiba o que fazer e o que não fazer no Dia do Índio:
1. Não use o Dia do Índio para mitificar a figura do indígena, com atividades que incluam vestir as crianças com cocares ou pintá-las.
Faça uma discussão sobre a cultura indígena usando fotos, vídeos, música e a vasta literatura de contos indígenas. "Ser índio não é estar nu ou pintado, não é algo que se veste. A cultura indígena faz parte da essência da pessoa. Não se deixa de ser índio por viver na sociedade contemporânea", explica a antropóloga Majoí Gongora, do Instituto Socioambiental.
2. Não reproduza preconceitos em sala de aula, mostrando o indígena como um ser à parte da sociedade ocidental, que anda nu pela mata e vive da caça de animais selvagens
Mostre aos alunos que os povos indígenas não vivem mais como em 1500. Hoje, muitos têm acesso à tecnologia, à universidade e a tudo o que a cidade proporciona. Nem por isso deixam de ser indígenas e de preservar a cultura e os costumes.
3. Não represente o índio com uma gravura de livro, ou um tupinambá do século 14
Sempre recorra a exemplos reais e explique qual é a etnia, a língua falada, o local e os costumes. Explique que o Brasil tem cerca de 230 povos indígenas, que falam cerca de 180 línguas. Cada etnia tem sua identidade, rituais, modo de vestir e de se organizar. Não se prenda a uma etnia. Fale, por exemplo, dos Ashinkas, que têm ligação com o império Inca; dos povos não-contatados e dos Pankararu, que vivem na Zona Sul de São Paulo.
4. Não faça do 19 de abril o único dia do índio na escola
A Lei 11.645/08 inclui a cultura indígena no currículo escolar brasileiro. Por que não incluir no planejamento de História, de Língua Portuguesa e de Geografia discussões e atividades sobre a cultura indígena, ao longo do ano todo? Procure material de referência e elabore aulas que proponham uma discussão sobre cultura indígena ou sobre elementos que a emprestou à nossa vida, seja na língua, na alimentação, na arte ou na medicina.
5. Não tente reproduzir as casas e aldeias de maneira simplificada, com maquetes de ocas
"Oca" é uma palavra tupi, que não se aplica a outros povos. O formato de cada habitação varia de acordo com a etnia e diz respeito ao seu modo de organização social. Prefira mostrar fotos ou vídeos.
6. Não utilize a figura do índio só para discussões sobre como o homem branco influencia suas vidas
Debata sobre o que podemos aprender com esses povos. Em relação à sustentabilidade, por exemplo, como poderíamos aprender a nos sentir parte da terra e a cuidar melhor dela, tal como fazem e valorizam as sociedades indígenas?
BRINCADEIRAS INDÍGENAS
Objetivos- Reconhecer a diversidade de grupos indígenas da América Latina.
- Conhecer os tipos de brincadeira indígena.
- Comparar o próprio modo de vida com o de crianças indígenas.
Conteúdos
- Povos da América Latina.
- Diversidade cultural.
Anos
2º ao 4º.
Tempo estimado
Três aulas.
Material necessário
Folhas de jornal ou de papel crepom colorido, barbante ou elástico.
Desenvolvimento
1ª etapa
Comece o trabalho explicando que o propósito é conhecer como brincam diferentes grupos de crianças na América Latina. De início, mostre imagens de brincadeiras em países dessa região, debatendo as semelhanças entre elas. Nesse ponto, é importante enfatizar dois aspectos. Primeiro: apesar de as comunidades indígenas serem muito diferentes, na maioria delas predominam as brincadeiras junto à natureza, principalmente nos rios. Segundo: os brinquedos são feitos de materiais retirados da floresta. Comente ainda que, em boa parte das atividades, os pequenos brincam em grupos e sem competir, aprendendo diversas práticas do cotidiano. Finalize essa etapa pedindo aos alunos que discutam sobre as diferenças e semelhanças em relação às próprias brincadeiras.
2ª etapa
Pergunte se conhecem uma peteca e se sabem usá-la. Proponha, então, que façam uma em sala. Comece amassando uma folha de jornal, formando uma bola achatada. Coloque-a no centro de outra folha, deixando as pontas soltas. Torça a folha na altura da bola e amarre com um barbante ou elástico. Se quiser, pinte com tinta guache. Com o brinquedo pronto, combine com o professor de Educação Física um jogo com a turma. De volta à classe, mostre que a palavra "peteca" vem de péte ka, de origem tupi, nome de um brinquedo feito pelos indígenas com palha seca de milho. É essencial explicar que o tupi era a língua falada em todo o litoral do Brasil até o século 18 e que inúmeras palavras dela foram incorporadas ao português. Por último, conte que, em Minas Gerais, o jogo de peteca é um esporte reconhecido e muito praticado, destacando a influência indígena na nossa cultura.
Avaliação
Proponha que os alunos produzam um texto curto que identifique a influência indígena na nossa cultura, com base em uma das brincadeiras que eles conheceram. O texto pode ser incrementado por meio da comparação com algum jogo que eles veem como semelhante aos dos indígenas. Avalie se a turma incorporou a compreensão de que esses povos não são homogêneos, mas diferentes em termos de cultura, língua e práticas sociais.
Consultoria: Daniel Vieira Helene
Coordenador de Ciências Sociais da Escola da Vila, em São Paulo, e selecionador do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.
A resposta está no processo histórico pelo qual passaram todas as nações indígenas que aqui viviam antes da chegada dos europeus, há mais de 500 anos, e que tiveram contato com o chamado mundo civilizado. Os guaranis, em particular, eram nômades. Ocupavam extensas áreas de terra e estabeleciam suas aldeias ora num local, ora noutro, conforme as condições de subsistência. Eram um povo alegre e amistoso. Dançavam para comemorar, para batizar seus filhos suas sementes. Dançavam para reverenciar a natureza, dançavam nas cerimônias religiosas. Com os processos de catequização e escravização disparados no período colonial, essa cultura milenar e a sabedoria acumulada havia gerações foram sendo anuladas à força e à custa de milhares de mortes.
A situação dos sobreviventes de Amambai neste começo de século 21 é o resultado de uma degradação que parece não ter fim. O trabalho de Ismael merece destaque e reconhecimento porque tenta interromper esse curso tortuoso da trajetória de seu povo. Confinados numa área demarcada que garante pouco mais de 3,4 mil metros quadrados por indivíduo, os 7 mil indígenas que vivem na aldeia praticamente esqueceram a ideia do deslocamento nômade. Não há mais espaço para a caça e sobrou muito pouco da mata, o rio está poluído, alcoolismo e drogas penetram facilmente na comunidade. Missões religiosas marcadas por doutrinas cheias de impedimentos promovem uma neocatequese que solapa ainda mais a cultura guarani. Dançar, nem pensar. Para os que já abandonaram a tradição - quase metade da aldeia -, é pecado.
O grande peso social e cultural do trabalho de Ismael equilibra-se com sua função pedagógica. "A dança, na perspectiva curricular atual, é tema de Educação Física a ser explorado em toda a Educação Básica", afirma o professor Marcelo Barros da Silva, selecionador do Prêmio Victor Civita de 2006. Ismael, ao tratar desse conteúdo, teve a sacada de optar pela dança do próprio povo. O movimento que resulta das coreografias desenvolve a força, a agilidade e a percepção rítmica (e faz muito mais pela cultura guarani).
Passo a passo do projeto de danças indígenas
O sol quente não tirou o ânimo de dona Élida, que, em seguida, dançou e cantou sem parar o guachiré, uma das danças que mais tarde seriam reproduzidas nas aulas de Ismael.
A pesquisa prosseguiu com o pajé Ramon, que, na escola, revelou lendas e mitos às crianças e ensinou a produzir adereços, como a taquara adornada para o jerojy, dança de defesa corporal. O primeiro passo é descascar o desenho que se quer.Em seguida, ensina o pajé, queima-se toda a superfície numa fogueira para escurecê-la.
Assim que começaram os ensaios na quadra da escola, a comunidade estranhou. A dança já não era mais algo típico dos guaranis de Amambai. Mas Ismael encontrou força na empolgação das crianças e seguiu adiante.
Pintar a pele com tinta à base de sementes também havia caído no esquecimento da aldeia. O professor fez reviver a tradição: traços paralelos para os meninos e circulares para as meninas.
Como um diretor teatral, Ismael se afasta na hora da apresentação e deixa as crianças à vontade para mostrar a coreografia ensaiada. Mas não resiste e cai na dança também.
Coordenador de Ciências Sociais da Escola da Vila, em São Paulo, e selecionador do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.
Alunos guaranis aprendem danças indígenas na escola
"Jajeroky jevy javya jova haguã." Em português, ''dancemos novamente para sermos felizes''. Em guarani, foi o jeito que um professor de Educação Física encontrou para mexer com a garotada de 1ª a 4ª série e recuperar antigas tradições indígenas adormecidas
Ismael Morel é professor de Educação Física na Escola Mbo'eroy Guarani/Kaiowa, aldeia de Amambai, sul de Mato Grosso do Sul. Em 2006, ele foi eleito Educador Nota 10 e recebeu o troféu do Prêmio Victor Civita por ter ensinado danças guaranis aos seus alunos - todos dessa mesma etnia. Sim, na aldeia de Ismael é preciso aprender na escola algo que, em tese, deveria fazer parte da tradição cultural. Por que isso acontece?A resposta está no processo histórico pelo qual passaram todas as nações indígenas que aqui viviam antes da chegada dos europeus, há mais de 500 anos, e que tiveram contato com o chamado mundo civilizado. Os guaranis, em particular, eram nômades. Ocupavam extensas áreas de terra e estabeleciam suas aldeias ora num local, ora noutro, conforme as condições de subsistência. Eram um povo alegre e amistoso. Dançavam para comemorar, para batizar seus filhos suas sementes. Dançavam para reverenciar a natureza, dançavam nas cerimônias religiosas. Com os processos de catequização e escravização disparados no período colonial, essa cultura milenar e a sabedoria acumulada havia gerações foram sendo anuladas à força e à custa de milhares de mortes.
A situação dos sobreviventes de Amambai neste começo de século 21 é o resultado de uma degradação que parece não ter fim. O trabalho de Ismael merece destaque e reconhecimento porque tenta interromper esse curso tortuoso da trajetória de seu povo. Confinados numa área demarcada que garante pouco mais de 3,4 mil metros quadrados por indivíduo, os 7 mil indígenas que vivem na aldeia praticamente esqueceram a ideia do deslocamento nômade. Não há mais espaço para a caça e sobrou muito pouco da mata, o rio está poluído, alcoolismo e drogas penetram facilmente na comunidade. Missões religiosas marcadas por doutrinas cheias de impedimentos promovem uma neocatequese que solapa ainda mais a cultura guarani. Dançar, nem pensar. Para os que já abandonaram a tradição - quase metade da aldeia -, é pecado.
O grande peso social e cultural do trabalho de Ismael equilibra-se com sua função pedagógica. "A dança, na perspectiva curricular atual, é tema de Educação Física a ser explorado em toda a Educação Básica", afirma o professor Marcelo Barros da Silva, selecionador do Prêmio Victor Civita de 2006. Ismael, ao tratar desse conteúdo, teve a sacada de optar pela dança do próprio povo. O movimento que resulta das coreografias desenvolve a força, a agilidade e a percepção rítmica (e faz muito mais pela cultura guarani).
Passo a passo do projeto de danças indígenas
1. A lição dos mais velhos
O sol quente não tirou o ânimo de dona Élida, que, em seguida, dançou e cantou sem parar o guachiré, uma das danças que mais tarde seriam reproduzidas nas aulas de Ismael.
Assim que começou a ensinar dança nas aulas de Educação Física, Ismael promoveu o contato da turma com antigos líderes da aldeia, como dona Élida. A sábia senhora falou durante horas com os alunos...
...que, em guarani, anotavam suas impressões no caderno para depois produzir textos em sala de aula.
2. As histórias do pajé
A pesquisa prosseguiu com o pajé Ramon, que, na escola, revelou lendas e mitos às crianças e ensinou a produzir adereços, como a taquara adornada para o jerojy, dança de defesa corporal. O primeiro passo é descascar o desenho que se quer.Em seguida, ensina o pajé, queima-se toda a superfície numa fogueira para escurecê-la.
O resultado esperado surge ao retirar a parte que não havia sido descascada, criando um fundo claro e deixando o desenho em destaque.
3. Os ensaios
Assim que começaram os ensaios na quadra da escola, a comunidade estranhou. A dança já não era mais algo típico dos guaranis de Amambai. Mas Ismael encontrou força na empolgação das crianças e seguiu adiante.
4. A pintura
Pintar a pele com tinta à base de sementes também havia caído no esquecimento da aldeia. O professor fez reviver a tradição: traços paralelos para os meninos e circulares para as meninas.
5. As apresentações
Como um diretor teatral, Ismael se afasta na hora da apresentação e deixa as crianças à vontade para mostrar a coreografia ensaiada. Mas não resiste e cai na dança também.
Quem é Ismael
Ismael Morel tem 26 anos, é filho de mãe indígena e pai paraguaio. Formado em Educação Física pela Unigran, de Dourados (MS), tem pós-graduação em Psicomotricidade e agora batalha por uma vaga de mestrado. Entre as diversas qualidades que apresenta, uma se destaca: jamais levanta a voz. Reside na argumentação clara e objetiva seu poder de convencer as pessoas e, sobretudo, seus alunos. Por mais que a turma esteja na maior algazarra, comandos rápidos e certeiros como uma flecha, disparados em guarani pelo professor, recuperam a ordem e a disciplina. Neste ano, Ismael foi convidado para uma conversa com o prefeito de Amambai, que pediu que ele se dedique em tempo integral ao trabalho com dança. E as conquistas continuam. Recentemente, ele foi eleito um dos vencedores do Prêmio Culturas Indígenas, promovido pelo Ministério da Cultura, e viaja em breve a Brasília para receber o troféu.
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